Como a Bíblia chegou até nós?

Como a Bíblia chegou até nós?

A questão de quais livros pertencem à Bíblia é chamada de questão canônica. A palavra cânon significa régua, vara de medir, regra, e, em relação à Bíblia, refere-se à coleção de livros que passaram pelo teste de autenticidade e autoridade. Significa ainda que esses livros são nossa regra de fé e vida. Mas, como foi formada esta coleção, adequadamente chamada de Bíblia?


Os Testes de Canonicidade

Em primeiro lugar é importante lembrarmos que certos livros já eram canônicos antes de qualquer teste lhes ser aplicado. Isto é como dizer que alguns alunos são inteligentes antes mesmo de se aplicar neles qualquer prova. Os testes apenas provam aquilo que já existe.
Os diversos concílios eclesiásticos reconheceram certos livros como sendo a Palavra de Deus e, com o passar do tempo, aqueles assim reconhecidos e profundamente analisados quanto á sua coerência e autenticidade, foram colecionados para formar o que hoje chamamos Bíblia.

E que testes foram aplicados ao longo dos séculos?

(1) Havia o teste da autoridade do escritor. Em relação ao Antigo Testamento, isto significava a autoridade do legislador, ou do profeta, ou do líder em Israel. No caso do Novo Testamento, o livro deveria ter sido escrito ou influenciado por um apóstolo para ser reconhecido. Em outras palavras, deveria ter a assinatura ou a aprovação de um apóstolo. Pedro, por exemplo, apoiou a Marcos, e Paulo a Lucas.

(2) Os próprios livros deveriam dar alguma prova intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e autorizado por Deus. Seu conteúdo deveria se demonstrar ao leitor como algo diferente de qualquer outro livro, por comunicar a revelação de Deus.

(3) O veredito das igrejas quanto à natureza canônica dos livros era importante. Na verdade, houve uma surpreendente unanimidade entre as primeiras igrejas quanto aos livros que mereciam lugar entre os inspirados. Embora seja fato que alguns livros bíblicos tenham sido recusados ou questionados por uma minoria, nenhum livro da Bíblia, cuja autenticidade tenha sido questionada por um grande número de igrejas, veio a ser aceito posteriormente como parte do cânon.

A Formação do Cânon

O cânon da Escritura estava-se formando, é claro, à medida que cada livro era escrito, e completou-se quando o último livro foi terminado. Quando falamos da "formação" do cânon estamos realmente falando do reconhecimento dos livros canônicos. Esse processo levou algum tempo. Alguns estudiosos afirmam que todos os livros do Antigo Testamento já haviam sido colecionados e reconhecidos por Esdras, no quinto século a.C. As referências nos escritos do historiador Flávio Josefo (95 A.D.) indicam a extensão do cânon do Antigo Testamento como sendo os 39 livros que conhecemos e aceitamos hoje.

Quando Jesus acusou os escribas de serem culpados da morte de todos os profetas que Deus enviara a Israel, desde Abel até Zacarias (Luc.11:51), Ele, desta forma, delimitou o que considerava ser a extensão dos livros canônicos. O relato da morte de Abel está no primeiro livro, Gênesis; o da morte de Zacarias se acha em II Crônicas, que é o último livro da disposição da Bíblia hebraica (em lugar do nosso Malaquias). Assim sendo, é como se Jesus tivesse dito: "A culpa de vocês está registrada em toda a Bíblia, de Gênesis a Malaquias". É interessante que Jesus nunca fez referência a nenhum dos livros chamados apócrifos, que já existiam em seu tempo, uma vez que os fatos neles relatados ocorreram no período intertestamentário, quase 200 anos antes de Seu nascimento.

O primeiro concílio eclesiástico a reconhecer todos os 27 livros do Novo Testamento foi o Concílio de Cartago, em 397 A.D. Alguns livros do Novo Testamento, individualmente, já haviam sido reconhecidos como canônicos muito antes disso (II Ped. 3:16; I Tim. 5:18), e a maioria deles foi aceita como canônicos no século posterior ao dos apóstolos, embora alguns como Hebreus, Tiago, II Pedro, II e III João e Judas tivessem sido debatidos durante algum tempo. A seleção do cânon sagrado foi um processo que continuou até que cada livro provasse o seu valor, passando pelos testes de canonicidade.

Os 12 livros chamados apócrifos do Antigo Testamento jamais foram aceitos pelos judeus ou por Jesus. Eles eram respeitados, mas não foram considerados como Escritura. Eles chegaram a ser incluídos na tradução grega chamada Septuaginta, produzida quase 300 anos antes de Cristo. Jerônimo (420-340 a.C) fez uma distinção entre esses livros e os canônicos, chamando-os de eclesiásticos, e essa distinção acabou por conceder-lhes uma canonicidade secundária. Os Reformadores também os rejeitaram. Em algumas versões protestantes dos séculos XVI e XVII, os apócrifos foram colocados à parte.

O Texto Bíblico que Conhecemos é Confiável?

Os manuscritos originais do Antigo Testamento e suas primeiras cópias foram escritos em pergaminho ou papiro, desde o tempo de Moisés (1450 a.C.) e até o tempo de Malaquias (400 a.C.). Até a sensacional descoberta dos Rolos do Mar Morto, em 1947, não possuíamos cópias do Antigo Testamento anteriores a 895 A.D. A razão disto acontecer era a veneração quase supersticiosa que os judeus tinham pelo texto, e que os levava a enterrar as cópias, à medida que ficavam gastas demais para uso regular.

Na verdade os tradicionalistas, ou massoretas, que acrescentaram os acentos e transcreveram a vocalização das palavras entre 600 e 950 A.D., padronizando em geral o texto do Antigo Testamento, engendraram maneiras sutis de preservar a exatidão das cópias que faziam. Verificavam cada página cuidadosamente, contando a letra média de cada página, livro e divisão. Devemos muito a estes religiosos detalhistas, em relação à veracidade do que hoje conhecemos. Alguém disse que qualquer coisa numerável era numerada por eles.

Quando os Manuscritos do Mar Morto foram descobertos, trouxeram à luz um texto hebraico datado do segundo século a.C., com todos os livros do Antigo Testamento, menos o de Ester. Essa descoberta foi extremamente importante, pois forneceu um instrumento muito mais antigo para verificarmos a exatidão do Texto Massorético, que se mostrou extremamente exato.

Outros instrumentos antigos de verificação do texto hebraico incluem a Septuaginta, os targuns aramaicos (paráfrases e citações do Antigo Testamento), citações em autores cristãos da antiguidade, a tradução latina de Jerônimo (a Vulgata, 400 A.D.), feita diretamente do texto hebraico corrente em sua época. Todas essas fontes nos oferecem dados que asseguram um texto extremamente exato do Antigo Testamento.

Em relação ao Novo Testamento, mais de 5.000 manuscritos dele existem ainda hoje, o que o torna o mais bem documentado dos escritos antigos. Além de existirem muitas cópias do Novo Testamento, muitas delas pertencem a uma data bem próxima à dos originais. Há aproximadamente 75 fragmentos de papiro datados desde 135 A.D., até o oitavo século, possuindo partes de 25 dos 27 livros do Novo Testamento, num total de 40% do texto total.
As muitas centenas de cópias feitas em pergaminho incluem o grande Códice Sinaítico (quarto século), o Códice Vaticano (também do quarto século) e Códice Alexandrino (quinto século).

Além disso, há cerca de 2.000 lecionários (livretos de uso litúrgico que contêm porções das Escrituras), mais de 86.000 citações do Novo Testamento nos escritos dos chamados Pais da Igreja, antigas traduções como a latina ou Ítala, a siríaca e a egípcia, datadas do terceiro século, e a versão latina de Jerônimo. Todos esses dados, mais o trabalho feito pelos estudiosos da paleografia, arqueologia e crítica textual, nos asseguram possuirmos um texto exato e fidedigno do Novo Testamento.

No entanto, o que realmente nos dá a certeza de que a Bíblia contêm o pensamento inspirado por Deus a homens escolhidos para esse fim, é o poder que suas verdades possuem. É impossível ler a Bíblia com sinceridade e oração sem ser tocado pela força de suas palavras. A maneira miraculosa como essas verdades atravessaram os séculos e chegaram até nós, transformando vidas, modificando costumes, abrandando corações e trazendo conforto, felicidade e paz de espírito a quem as lê nos dão a certeza de que Deus nos fala através de suas páginas.

Os Livros que Compõem o Cânon Sagrado

ANTIGO TESTAMENTO

Nome do Livro
Quando Foi Escrito
Quem Escreveu
Gênesis
1.450 - 1.410 a.C
Moisés
Êxodo
1.450 - 1.410 a.C
Moisés
Levítico
1.450 - 1.410 a.C
Moisés
Números
1.450 - 1.410 a.C
Moisés
Deuteronômio
1.410 a.C
Moisés
Josué
1.400 - 1.370 a.C
Josué
Juízes
1.050 - 1.000 a.C
Anônimo
Rute
1.000 a.C
Desconhecido
I Samuel
930 a.C
Samuel e outros
II Samuel
930 a.C
Samuel e outros
I Reis
550 a.C
Jeremias
II Reis
550 a.C
Jeremias
I Crônicas
450 - 425 a.C
Esdras
II Crônicas
450 - 425 a.C
Esdras
Esdras
456 - 444 a.C
Esdras
Neemias
445 - 425 a.C
Neemias
Ester
465 a.C
Incerto
Data incerta
Incerto. Talvez Moisés
Salmos
Data incerta
Daví e outros
Provérbios
950 - 700 a.C
Salomão e outros
Eclesiastes
935 a.C
Salomão
Cantares
965 a.C
Salomão
Isaías
740 - 680 a.C
Isaías
Jeremias
627 - 585 a.C
Jeremias
Lamentações
586/5 a.C
Jeremias
Ezequiel
592 - 570 a.C
Ezequiel
Daniel
537 a.C
Daniel
Oséias
710 a.C
Oséias
Joel
835 a.C
Joel
Amós
755 a.C
Amós
Obadias
586 a.C
Obadias
Jonas
760 a.C
Jonas
Miquéias
700 a.C
Miquéias
Naum
663 - 612 a.C
Naum
Habacuque
607 a.C
Habacuque
Sofonias
625 a.C
Sofonias
Ageu
520 a.C
Ageu
Zacarias
520 - 518 a.C
Zacarias
Malaquias
450 - 400 a.C
Malaquias

NOVO TESTAMENTO

Nome do Livro
Quando Foi Escrito
Quem Escreveu
Mateus
60 - 70 A.D.
Mateus
Marcos
50 - 60 A.D.
Marcos
Lucas
60 A.D.
Lucas
João
85 - 90 A.D.
João
Atos
61 A.D.
Lucas
Romanos
58 A.D.
Paulo
I Coríntios
56 A.D.
Paulo
II Coríntios
57 A.D.
Paulo
Gálatas
49 ou 55 A.D.
Paulo
Efésios
61 A.D.
Paulo
Filipenses
61 A.D.
Paulo
Colossenses
61 A.D.
Paulo
I Tessalonicenses
51 A.D.
Paulo
II Tessalonicenses
51 A.D.
Paulo
I Timóteo
63 A.D.
Paulo
II Timóteo
66 A.D.
Paulo
Tito
65 A.D.
Paulo
Filemon
61 A.D.
Paulo
Hebreus
64 - 68 A.D.
Incerto. Talvez Paulo
Tiago
45 - 50 A.D.
Tiago
I Pedro
63 A.D.
Pedro
II Pedro
66 A.D.
Pedro
I João
90 A.D.
João
II João
90 A.D.
João
III João
90 A.D.
João
Judas
70 - 80 A.D.
Judas
Apocalipse
90 A.D.
João

Por Charles C. Ryrie (Baseado em A Survey of Bible Doctrine)